Outro dia, numa festa, um grupo de homens comentava numa
rodinha que um amigo tinha virado gay. Separou da mulher e virou gay. Assim,
como quem descobre de um dia para o outro que prefere uva a maçã.
“Eu sempre achei que ele levava jeito”, disse um deles.
Não foi o suficiente para acalmar os demais. Reparei na risada um tanto nervosa
daqueles machos cinquentões, como se aquele acontecimento tivesse o poder de
balançar suas certezas, de lhes plantar uma pulga atrás da orelha: será que eu
também…? Não foi a primeira vez que presenciei conversas do gênero. Ao
contrário, elas têm se tornado cada vez mais frequentes.
Tenho notado também que, nos últimos tempos, volta e meia
aparece uma notícia bizarra envolvendo se tornar homossexual num piscar de
olhos. Literalmente. Em novembro passado, veio à tona a história do jogador de
rúgbi britânico que, ao acordar do coma após sofrer um AVC, se descobriu gay,
pintou o cabelo, emagreceu, começou a malhar na academia e arranjou um
namorado. “Sei que parece estranho, mas quando ganhei consciência,
imediatamente me senti diferente. Não estava mais interessado em mulheres, eu
era definitivamente gay. E nunca tinha sentido atração por homens antes”, jurou
o rapaz.
Na semana passada, uma transexual americana de 40 anos
revelou que se chamava Ted, era felizmente casado com uma mulher e tinha dois
filhos, até que, em uma tarde ensolarada de primavera, foi picado por uma
abelha. Seu organismo passou então a perder testosterona, o hormônio masculino.
Ao passar as mãos sobre sua pele e senti-la macia, gostou da metamorfose e
resolveu ir mais fundo: fazer uma cirurgia de mudança de sexo. Ao contrário do
jogador de rúgbi, porém, ela admitiu que, quando criança, brincava de se vestir
de menina e tinha sentimentos ambíguos em relação à sua identidade.
Vejo dois sintomas aí: um é a relativa conveniência da
situação. Deve ser bem mais cômodo atribuir a homossexualidade a um AVC ou a
uma picadura (ops) de abelha do que admitir que sempre sentiu atração por
pessoas do mesmo sexo. Algo como: “Ah, eu era superhetero e tinha três
namoradas, até que um raio caiu na minha cabeça numa sexta-feira 13 e virei
gay”. Ou: “Eu tinha uma família adorável com mulher e cinco filhos, mas um dia
tomei por engano uma caixa de paracetamol e agora me sinto atraído por homens”.
Num passe de mágica, contorna-se o conflito com a família e a sociedade: foi só
um efeito colateral, gente.
Outro sintoma, mais subjetivo, é o completo pânico
heterossexual que vejo por trás dessas notícias. “Quer dizer que eu também
posso virar gay assim, sem mais nem menos?” Tenho observado que, com a maior
divulgação da causa gay e a maior visibilidade dos próprios homossexuais, o
mundinho hétero entrou em polvorosa. Como se os machos tivessem se transformado
em uma espécie em extinção. Como se a homossexualidade fosse contagiosa e os
que se salvarem da “praga” não fossem resistir ao meteoro que irá se chocar contra
a Terra em 2014, matando todos os heterossexuais, assim como aconteceu com os
dinossauros: bum! Ah, vocês não estavam sabendo disso? Brincadeirinha…
(Um terceiro sintoma poderia ser o desejo oculto de alguns
de que o tal raio da homossexualidade caísse de uma vez por todas em sua
cabeça. “Que alívio!” Mas esse eu deixo para os psicanalistas.)
Honestamente, rapazes? Não entendo do que vocês sentem
tanto medo. Alguns dos homens mais bem resolvidos que eu conheci confessaram já
ter sentido dúvidas em relação a sua sexualidade. Outros – menos numerosos, é
verdade – até assumiram ter tido uma ou outra experienciazinha com o mesmo
sexo, na infância e até depois dela. Relaxem, garotos. Tenho certeza que vai
haver menos homofobia e mais tolerância no mundo no dia em que todo macho do
planeta for capaz de admitir que pelo menos em algum momento da vida, por fugaz
que fosse, passou pela sua cabeça que… Talvez… Quem sabe? E o que é que tem de
mal nisso?
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